Adilson Santos Martins - Dissertação
RESUMO: O fenômeno da interação de genótipos com ambientes (GxA) - resposta diferencial de genótipos às variações ambientais - é questão central no dia-a-dia dos profissionais envolvidos em programas de melhoramento vegetal. Os esforços recentes envidados pela pesquisa em melhoramento vegetal conduziram a duas alternativas quanto à forma de lidar com este fenômeno: ou o zoneamento ecológico para recomendações particularizadas ou os estudos de estabilidade para recomendações generalizadas (DUARTE, 1988). Apoiando estas duas alternativas houve uma melhoria das análises devido ao desenvolvimento de técnicas mais acuradas, até chegar recentemente na análise AMMI (do inglês, Additive Ma,n effects and Multiplicative Interaction), conforme CHAVES (2001). O zoneamento ecológico utiliza dados referentes à interação de genótipos com ambientes e técnicas de análises estatísticas e de aglomeração para a definição de sub-regiões dentro de uma região em estudo. Sub-regiões homogêneas agrupam locais que apresentam padrões de interação mais semelhantes, de forma que a magnitude da variação da interação GxA entre sub-regiões seja maior que dentro de sub-regiões. O problema, nesta alternativa, é que pode ser necessário um número elevado de sub-regiões para atingir unia performance ótima para as variedades. Já as pesquisas voltadas para estudos de estabilidade têm mostrado que a interação GxA é um caráter que está sob controle genético e que, sua herdabilidade e repetibilidade e, em geral, menor que a do caráter produtividade de grãos, por exemplo, conforme menciona BRASIL (1990). Estudos dessa natureza chegaram num ponto, a partir do qual os avanços dependem de melhor entendimento da interação GxA e de suas relações com seus prováveis fatores causais para, dessa forma, poder se tirar melhor proveito das vantagens desta interação GxA em programas de melhoramento vegetal. A orientação geral das pesquisas relacionadas aos estudos de estabilidade é, primeiramente, selecionar para produtividade e, depois, entre as variedades mais produtivas, recomendar as mais estáveis (TORRES, 1988). Tanto a alternativa do zoneamento ecológico quanto a do estudo de estabilidade têm suas limitações. A recomendação generalizada, decorrente de estudos de estabilidade, tem a desvantagem de se admitir uni certo grau de perdas de produção em relação à situação ideal, na qual se recomendaria a melhor variedade para cada sub-região. Por outro lado, a recomendação particularizada, decorrente do zoneamento ecológico, encontra um limite no numero de sub-regiões a serem utilizadas num programa de melhoramento; este limite está no ponto definido pela viabilidade econômica da implantação de estações experimentais pelas empresas de melhoramento. Para ilustrar a questão da possibilidade de perdas envolvida na recomendação generalizada de variedades, tomar-se-á um exemplo. No estado de Goiás, a área plantada com soja na safra 2002/2003 foi de 2,0 milhões de ha, com produtividade média esperada de 2.952 kg/ha (TIMOSSI, 2002). Supondo uma perda média de 10% na produtividade geral em decorrência do uso do método de recomendação generalizada, a perda de faturamento do Estado pode chegar a R$344 milhões em uma safra. Tomando-se as previsões do mesmo órgão para o Brasil, essas perdas poderiam chegar a R$3,4 bilhões em urna safra. Convém ressaltar que mesmo se esses cálculos fossem feitos com perdas menores (5%, por exemplo), mas envolvendo as demais espécies cultivadas no Brasil, as cifras seriam bastante significativas. Na agricultura moderna, dentro do contexto do mundo globalizado que exige cada vez mais eficiência nos processos produtivos, 1% de acréscimo na produtividade média pode significar de 5% a 10% de aumento na margem de lucro de um agricultor. Se por um lado sabe-se que há perdas na produção geral de uma região, por outro lado há consenso de que a intensificação da sub-divisão em elevado número de sub-regiões pode ser inviável para as empresas de melhoramento. Cabe buscar alternativas intermediárias, que atendam a necessidade de aumentar a eficiência do processo de recomendação de cultivares sem exageros no número de pontos da amostragem ambiental. Annicchiarico (2002) comenta que informações adicionais sobre fatores climáticos, edáficos e bióticos dos locais de testes e de caracteres morfofisiológicos dos genótipos podem ser de extremo valor para a compreensão das razões de ocorrência da interação GxA, para a caracterização ambiental e para a extensão de resultados para outros pontos. Esse mesmo autor acrescenta que a possibilidade de uso de um SIG facilita grandemente a caracterização de regiões, bem como a extrapolação de resultados: tanto espacialmente, para pontos mais distantes dos locais de testes, quanto temporalmente, através de estimativas de médias e vanâncias de variáveis climáticas relevantes. Num contexto de crescente disponibilidade de sistemas de informações geográficas e dados espaciais, o entendimento da variação espacial da resposta das culturas ao ambiente pode passar a ser um componente essencial da pesquisa agronômica. Nesse sentido White et al. (2002) faz a previsão de um amplo uso de mapas, de referências à variação espacial e de análises baseadas nos poderosos recursos dos SIG, refletindo em uma melhor escolha de locais de teste e de tratamentos, em um melhor entendimento da influencia de fatores climáticos e edáficos na resposta das culturas e em resultados quantitativos com interpretação facilitada pela apresentação através de mapas. Os métodos de análise estatística mais comumente utilizados não levam em consideração, de forma explícita, a distribuição espacial da variável em estudo e, nem sempre fazem estudo conjunto ou integrado do comportamento do fenômeno com os seus fatores causais mais prováveis (CÂMARA et al., 2002). Isto, em parte, por limitações inerentes aos próprios métodos e, em parte, pela questão histórica de se adotarem as pressuposições básicas dos métodos de análise mais comuns, o que lhes confere simplicidade e facilidade de uso, mesmo ao custo de perda de precisão e de poder discriminativo e informativo. Alguns métodos de análise espacial, apesar de superiores aos métodos mais comumente utilizados, são limitados no que diz respeito às possibilidades de extrapolação dos resultados obtidos, por não conterem, em seus procedimentos, recursos que permitam inferir e visualizar a estrutura da distribuição espacial da variável em estudo. Alternativa que preenche essa lacuna são os denominados Sistemas de Informações Geográficas (SIG). Nos últimos vinte anos ocorreu um acelerado desenvolvimento deste tipo de ferramenta computa~ional para processamento de informações geográficas, que disponibiliza um conjunto de funcionalidades que permitem integrar dados de diversas fontes e realizar análises que levam em conta a distribuição espacial, individual ou conjunta, dos vários fatores em estudo, bem como fazer inferências e gerar mapas que ilustram de maneira bastante informativa o padrão da distribuição espacial do fenômeno em estudo. No Brasil, a aplicação de SIG em modelagem ambiental e na agricultura já foi testada, implementada e publicada. Há exemplos de uso na espacialização de dados climáticos, datas de plantio, monitoramento ambiental, determinação de períodos mais prováveis de veranicos, zoneamento agroclimático da soja, entre outros (ASSAD & SANO, 1998). Na agricultura de precisão, o SIG, aliado a técnicas de geoestatística, é parte fundamental do processo de análise de dados georreferenciados, interpretação e tomada de decisão. No caso da soja, existem iniciativas da EMBRAPA-Solos em pesquisas relacionadas à recomendação de adubação da soja sob plantio direto, conduzidas por MACHADO (2000) e em pesquisas relacionadas à viabilidade técnica-econômica para implantação da agricultura de precisão na cultura de soja sob rotação de culturas em plantio direto, coordenadas por STRAUCH (2000). O entendimento das propriedades da interação GxA, bem como de seu padrão de distribuição espacial e de seu relacionamento com os fatores causais pode trazer contribuições significativas em dois aspectos: num primeiro aspecto, de natureza científica, aproveitando o melhor conhecimento da interação GxA em delineamento de estratégias de melhoramento genético; num segundo aspecto, de natureza tecnológica, subsidiando a elaboração de procedimentos racionais para estudo da interação utilizando ferramentas de geoprocessamento, possibilitando a produção de mapas de recomendação mais precisos e informativos. A utilização de maior número de Localidades na rede de ensaios de um programa de melhoramento é limitada pelo alto custo e complexidade logística da instalação e acompanhamento dos experimentos. A possibilidade de usar os dados dos poucos pontos amostrados para estender o comportamento produtivo dos genótipos a pontos não observados é tarefa que exige o uso de ferramentas e técnicas adequadas. Isso pode ser implementado através do emprego de SIG, que são dotados de procedimentos de predição espacial que auxiliam o usuário na etapa inferencial. O presente estudo se propõe a pesquisar a natureza e as propriedades da interação GxA em soja, buscando entender as relações entre a interação e os fatores ambientais, para, em seguida, implementar no ambiente de um SIG um modelo de predição espacial do comportamento produtivo de genótipos de soja, gerando mapas que poderão ser utilizados em uma nova abordagem de recomendação de cultivares. Numa primeira fase o SIG será utilizado para viabilizar a aquisição de dados de variáveis ambientais obtidos por sensoriamento remoto. Em seguida, esses dados serão utilizados em análises de regressão visando identificar as variáveis com participação importante nas somas de quadrados das interações GxA. Os resultados obtidos das análises de regressão serão utilizados no modelo a ser implementado no SIG para a inferência espacial das médias preditas para cada genótipo. Numa fase intermediária o SIG será utilizado para realizar a predição espacial das variáveis identificadas nas análises de regressão. E, finalmente, com base no modelo a ser implementado e, utilizando os recursos de análise espacial do SRI, pretende-se gerar mapas classificados por faixas de produtividade para cada genótipo. |