Roberto Miranda Pacheco - Tese


RESUMO: A presença da interação de genótipos com ambientes (GxA) implica em que dois ou mais genótipos tenham seu posicionamento relativo alterado ou apresentem variância distinta em locais ou anos diferentes. A presença desse fenômeno pode levar a superestimativas do valor da herdabilidade, com conseqüente superestimação dos ganhos a serem alcançados com a seleção. Pode também acarretar uma redução da produtividade global de uma área para a qual se faça uma recomendação geral de um dado cultivar. Por outro lado, pode-se tirar proveito de sua existência usando procedimentos estatísticos que identifiquem o padrão dessa interação, gerando informações que possibilitem o agrupamento de locais em estratos dentro dos quais a magnitude da interação não seja significativa. Recomendações específicas para tais estratos maximizariam a produção de toda a região considerada. Da mesma forma, a condução dos programas de seleção considerando tal zoneamento propiciaria estimativas mais precisas dos ganhos por seleção. A proposta deste trabalho foi analisar a similaridade e diversidade entre locais de teste de germoplasma de soja, na região dos cerrados do Brasil Central, com base em informações da interação GxA. Especificamente, teve como objetivo a avaliação e identificação de métodos de estratificação de ambientes, com base na interação GxA, a conseqüente recomendação de zonas agronômicas ou mega-ambientes, que mostrem consistência ao longo dos anos e a identificação de locais-chave para condução e teste de genótipos nas distintas fases de um programa de melhoramento genético de soja. O trabalho apresenta também uma abordagem alternativa para a identificação de material genético promissor em termos de adaptabilidade e estabilidade fenotípica. Essa alternativa é fundamentada no uso de genótipos suplementares em análise AMMI (additive main effects and multiplicative interactions). Foram utilizados dados de produtividade de grãos (kg/ha) provenientes de ensaios regionais de avaliação de linhagens de soja, de três ciclos de maturação (precoce, médio e tardio). Os ensaios foram conduzidos ao longo de três anos agrícolas (1999/2000, 2000/2001 e 2001/2002), em dezoito localidades da região, nos Estados de Goiás, Mato Grosso, Bahia, Minas Gerais e no Distrito Federal. O delineamento experimental utilizado foi o de blocos completos ao acaso, com quatro repetições. Foram utilizados três procedimentos para a estratificação dos ambientes. Um deles teve como base o método proposto por Horner & Frey (1957), e os outros dois se fundamentaram na análise AMMI. A estratificação com base no primeiro foi realizada a partir de análises conjuntas de variância para todos os pares de locais, em cada ano. O segundo método de estratificação baseou-se numa distância entre locais para a interação estimada por um modelo AMMI de análise. O terceiro método de estratificação baseou-se na abordagem de genótipos vencedores, tendo sido aplicado a estimativas de interação provenientes dos modelos AMMI1, AMMI2, AMMI3 e AMMI4. Identificou-se, para cada modelo, o genótipo vencedor em cada um dos locais. Nessa abordagem, um estrato ambiental é definido como o conjunto de locais com um genótipo vencedor em comum. Definiu-se também um local-chave para a condução de fases iniciais do programa como aquele que melhor classifica os genótipos vencedores na região e, como locais-chave para as fases finais, aqueles que melhor representam cada estrato em termos de sua adaptabilidade ao respectivo genótipo vencedor. Essa adaptabilidade foi estimada pela distância entre o escore IPCA1 (first interaction principal components analysis axis) de cada local do estrato e o escore do genótipo vencedor que caracterizou o estrato. As estratificações ambientais realizadas com base nos dois primeiros métodos, não apresentaram possibilidade de uso prático, pelo fato dos estratos resultantes não terem mostrado consistência nos três anos avaliados. Por outro lado, a estratificação com base na abordagem de genótipos vencedores possibilitou a formação de agrupamentos de locais que se mostraram consistentes ao longo do período de estudo, nos três ciclos de maturação. De um total de dezoito locais associados a cada ciclo, foram identificados três agrupamentos no ciclo médio de maturação, três no ciclo precoce e quatro no ciclo tardio. Os resultados indicam que os grupos formados têm caráter preditivo, pois foram identificados a partir de conjuntos de genótipos diferentes em cada ano e ciclo, e se confirmaram nos três anos do estudo. Os agrupamentos para o ciclo médio foram: Grupo 1 (Buritis, Correntina, Cristalina, Lucas do Rio Verde, Placas, Planaltina, Rio Verde e Uberaba), Grupo 2 (Anápolis, Capinópolis, Sacramento e Senador Canedo) e Grupo 3 (Luziânia, Mineiros e Pamplona), tendo os locais Iraí, Chapadão do Céu e Uberlândia, sido considerados como estratos ambientais isolados. Para o ciclo precoce: Grupo 1 (Buritis, Capinópolis, Correntina, Lucas do Rio Verde e Rio Verde), Grupo 2 (Cristalina, Luziânia, Mineiros, Placas e Sacramento) e Grupo 3 (Anápolis, Pamplona e Uberlândia); e as localidades Chapadão do Céu, Iraí, Planaltina, Senador Canedo e Uberaba, como estratos independentes. Para o ciclo tardio: Grupo 1 (Anápolis, Capinópolis, Chapadão do Céu, Conquista, Lucas do Rio Verde, Mineiros, Rio Verde e Senador Canedo), Grupo 2 (Buritis e Luziânia), Grupo 3 (Correntina, Cristalina e Placas) e Grupo 4 (Pamplona e Planaltina), além dos locais Iraí, Sacramento e Uberaba, como estratos isolados. Os locais que melhor classificaram os genótipos vencedores ao longo do espaço (região) e do tempo (anos), nos três ciclos de maturação, foram Mineiros, Placas e Rio Verde. Dentre esses, os resultados deste estudo suportam a indicação das localidades Rio Verde ou Placas como local-chave para o desenvolvimento das fases iniciais do programa de melhoramento. A escolha de um ou outro deve, então, ser realizada em função de facilidades administrativas e operacionais, que são também de grande relevância para a eficiência e eficácia do programa. Para as fases finais de seleção de genótipos, por ciclo de maturação, os resultados obtidos permitem indicar os seguintes locais-chave: Buritis, Pamplona, Senador Canedo, Iraí, Chapadão do Céu e Uberlândia (ciclo médio); Buritis, Pamplona, Placas, Iraí, Chapadão do Céu, Uberaba, Planaltina e Senador Canedo (ciclo precoce); e Buritis, Placas, Pamplona, Rio Verde, Sacramento, Iraí e Uberaba (ciclo tardio). São recomendados, portanto, onze locais-chave para representar os três ciclos de maturação em toda a região. O trabalho apresenta ainda um procedimento para representação gráfica de um genótipo suplementar de referência, em estudos de adaptabilidade e estabilidade por análise AMMI. Este genótipo hipotético pode ser definido de acordo com critérios de interesse do pesquisador, tendo sido, neste trabalho, assumido como aquele com as mais altas produtividades observadas em cada local. Assim, o genótipo cujo escore mais se aproximar do escore do genótipo suplementar é o que interage com os ambientes de forma mais similar a esse genótipo hipotético, isto é, com propriedades de interagir favoravelmente com os ambientes avaliados. Uma aplicação dessa abordagem ao estudo da adaptabilidade e estabilidade dos genótipos é apresentada com a devida interpretação.